Trânsito é a maior causa de paraplegia
Os acidentes de trânsito continuam respondendo pela maior parte dos casos de perda dos movimentos do corpo abaixo do tronco. Segundo uma pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) feita com 111 pacientes do Hospital Sarah Kubitschek, 49,5% deles sofreram algum tipo de dano físico relacionado com a atividade. Entre os acidentados no trânsito, metade estava em motocicletas. O número surpreende, pois a frota de motocicletas na capital do País corresponde a apenas 10% de todos os veículos. No Brasil, chega a 17%, segundo números do IBGE.
O estudo, feito pela enfermeira Luciana Bampi na Faculdade de Ciências da Saúde (FS), mostra que, do total de paraplégicos, 25,2% se envolveram em colisões com motos, 21,6% com carros, 1,8% foram vitimas de atropelamento e 0,9% de situações em que havia bicicleta. Os 51,5% restantes provêm de ferimento por arma de fogo, com 27% do total; quedas de altura, com 15,3%; quedas de objeto sobre o corpo, com 6,3%; e uso de arma branca, em 1,8% dos casos.
Para a pesquisadora, por mais que as mobilizações pela paz surjam nas cidades, além de campanhas nas rodovias, ainda falta conscientização. “Os dados mostram o abandono da educação para o trânsito’, afirma.
Em meio a estatísticas e números, sobressai a face perversa de quem adquire a condição de paraplégico: jovem e com baixa instrução. Em termos absolutos, 34,2% são jovens na faixa dos 21 a 30 anos, sendo que 53,2% dos acidentados completaram somente o ensino fundamental. A grande maioria, 84%, é formada por homens.
Além disso, as estatísticas mostram que os trabalhadores da indústria química e siderúrgica respondem pelo grupo mais atingido, com 17,1%. Em seguida vêm os trabalhadores do comércio, lojas e mercados, com 12,6%, seguidos pelos trabalhadores de manutenção e reparação, com 11,7% e trabalhadores agropecuários, com 10,8%.
Para Luciana, o quadro expõe uma situação preocupante. Tendo em vista que o perfil dos novos paraplégicos mostra indivíduos que já integram um contexto de exclusão econômica, ultrapassar essa barreira deve se tornar ainda mais difícil. “São pessoas jovens, com uma vida toda pela frente, que executavam trabalhos que requerem força. Como vão voltar a fazê-los em o aparato físico?”.
Por outro lado, pacientes que têm melhores condições financeiras acabam enfrentando menos dificuldades para prosseguir em suas atividades. Ao desempenhar trabalhos intelectuais, a perda dos movimentos não afeta com a mesma intensidade sua vida profissional. Além disso, esse público pode se deslocar com carros adaptados, sem a dependência de ônibus com plataformas para cadeirantes.
AUTO-IMAGEM – Apesar do comprometimento de parte do corpo, o estudo evidenciou que os pacientes se vêem como pessoas capazes e como cidadãos com direitos iguais aos de outras pessoas. “Para eles, ter a lesão não significa ser deficiente. Eles não se sentem doentes”, afirma.
Desta forma, o sentimento de inadequação surge mais pelo preconceito e pelas dificuldades em atuar no mundo do que pelas suas próprias convicções. Sendo assim, os paraplégicos experimentam as limitações quando se deparam com um mundo que não oferece trabalhos adequados às suas condições físicas ou facilidades como calçadas adaptadas e banheiros apropriados.
QUALIDADE DE VIDA – Um dos objetivos do estudo era descobrir como está a qualidade de vida das pessoas com lesão medular, resposta que obteve o critério “ruim”, levando-se em consideração os fatores elencados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A metodologia analisa a dimensão física, a psicológica, a do relacionamento social e a do ambiente.
Os piores índices foram registrados nos âmbitos físico e de meio ambiente. No primeiro, a mais baixa pontuação encontra-se nos itens locomoção, capacidade para trabalhar, não dependência de tratamentos, capacidade de desempenhar atividades. Todas ficaram abaixo de 3 numa escala de 1 a 5. Quando menor o número, pior o desempenho.
Na categoria meio ambiente, também estão abaixo de três os fatores recursos financeiros, atividade de lazer, oportunidade de novas informações e meio de transporte, nessa seqüência.
Na ponta oposta, em relações sociais, surgiram os maiores índices, principalmente em apoio social e relações pessoas, bastante próximos a 4. Quanto ao aspecto psicológico, crenças pessoais obteve 4 pontos e, os demais, pouco abaixo disso, entre eles concentração, auto-estima, ausência de sentimentos negativos e aceitação da aparência física.
Para Luciana, o estudo mostra que a melhor forma de reduzir a sensação de deficiência física experimentada por quem ficou paraplégico é vê-lo como uma pessoa pode fazer parte da sociedade. “São pessoas que podem trabalhar, estudar. Intelectualmente, não foram afetadas em nada”.
Fonte: UnB
