Saúde do Trabalhador: Pesquisa da UnB ajuda a mudar a lei
Uma tese de doutorado ainda em andamento na Universidade de Brasília (UnB) já provocou duas mudanças significativas na legislação de saúde do trabalhador no Brasil. Desde abril de 2007, por meio do Decreto Presidencial 6.042, o funcionário que sofrer um acidente ou contrair uma doença não precisará mais provar para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que os danos foram causados pelo desempenho de sua atividade profissional.
Por meio de uma metodologia chamada Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP), criada pelo pesquisador Paulo Rogério Albuquerque de Oliveira, doutorando em Ciências da Saúde na UnB, será possível identificar acidentes e enfermidades comuns a determinados ramos de atividade. Assim, se o trabalhador padecer de uma doença, que pela lei está associada à atividade da empresa, fica caracterizado o acidente ou doença do trabalho. Com esse modelo, o ônus da prova passa a ser do empregador.
Antes de requerer os benefícios no INSS, os contribuintes com doença ou que sofreram acidente devem solicitar um documento – o Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT) – ao empregador. Desde que a nova metodologia passou a valer, o CAT, que também pode ser emitido pelos sindicatos de categoria ou de próprio punho, não é mais condição fundamental para que o INSS forneça o auxílio. Os próprios peritos do INSS é que fazem a associação da doença com a atividade laboral por meio da metodologia.
Sob a orientação da professora Anadergh Barbosa-Branco, Oliveira usou o banco de dados do INSS para identificar os problemas de saúde que mais acometeram os trabalhadores brasileiros entre 2000 e 2004 e as áreas em que atuavam. Assim foi possível aferir quais seguimentos corriam mais riscos de doenças ocupacionais.
DIREITOS – Embora para o empregado não haja diferenças se ele receber o auxílio-doença acidentário (relacionado ao trabalho) ou o auxílio-doença previdenciário (não relacionado ao trabalho), pois ambos tem o mesmo valor monetário, essa legislação abre uma outra frente para proteger o direito do trabalhador brasileiro. Isso significa que, provada a relação com o trabalho, além da estabilidade por um ano e do FGTS depositado em conta, o funcionário poderá entrar na Justiça com ações indenizatórias por danos materiais e morais, ações penais contra a responsabilidade da empresa e ações ambientais, já que o trabalho também faz parte do meio ambiente. O risco de sofrer essas penalidades pode fazer com que, no futuro, com que as empresas mudem as condições laborais.
Não são poucos os que ficam doentes pelo resto da vida ou com seqüelas, em virtude das atividades laborais. Só no Brasil, em 2006, o Ministério da Previdência Social concedeu 140.998 auxílios-doença acidentários, benefício concedido ao segurado impedido de trabalhar por doença ocupacional ou acidente de trabalho por mais de 15 dias consecutivos. Suspeita-se que esse número seja ainda maior, já que muitos auxílios-doença não são caracterizados como relacionados à atividade laboral. No mesmo ano, também foram concedidos 2,18 milhões de benefícios do tipo auxílio-doença previdenciário (não relacionado ao trabalho). “Há uma discrepância enorme, entre esses dois números. Agora, esperamos que a situação inverta”, comenta Oliveira, autor da metodologia.
PREVENÇÃO – Além disso, a partir de janeiro de 2008, o Seguro de Acidente de Trabalho (SAT), tributo pago pelas empresas, que varia entre 1%, 2% e 3% de acordo com o seguimento econômico, será revisto a partir de critério científicos. Ele será multiplicado pelo Fator Acidentário de Prevenção (FAP), também criado por Oliveira. Esse índice varia entre 0,5 e 2, conforme os riscos da empresa para seus trabalhadores. O Decreto 6.042, que regulamenta essas as mudanças, foi assinado em 12 fevereiro de 2007 pelo Presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva.
“O FAP vai atacar as causas das doenças ocupacionais e funcionar como um estímulo à prevenção. Assim, aquelas empresas que tiverem mais acidentes de trabalho pagarão um acréscimo de até 100% referentes ao custeio do SAT, enquanto aquelas que se prevenirem terão um bônus-tributo”, explica.
BASTIDORES – Oliveira, que trabalha como assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Previdência Social, costuma dizer que sua tese teve dois momentos: o da pesquisa científica e o do embate político. Quando viu os dados preciosos que tinha em mãos, iniciou uma articulação por meio de conferências municipais, estaduais e nacional de saúde do trabalhador, que contam com a participação da população, do Conselho Nacional de Saúde e de representantes de setores públicos e privados ligados ao trabalho.
Nessas instâncias representativas, foi aprovado o texto do decreto, que foi então apresentado em fóruns, seminários e no Congresso Nacional. Deu certo. O decreto que regulamenta as mudanças foi lançado pelo Governo Federal antes mesmo que Oliveira terminasse de cumprir os créditos para terminar o doutorado. Em novembro de 2007, ele deve defender a tese na UnB.
SERVIÇO – Para conhecer os detalhes do decreto e saber quais são as doenças relacionadas a sua profissão, consulte o endereço eletrônico do governo
Os procedimentos para requisitar o auxílio-doença (quando o trabalhador fica afastado por mais de 15 dias) e o auxílio-doença acidentário (quando fica incapacitado para o trabalho) estão disponíveis na página eletrônica da Previdência Social, no link www.previdenciasocial.gov.br/pg_secundarias/beneficios_06.asp.
